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Padre Jaime Inácio de Oliveira (1953-2014)

1. Introdução
A vida pode ser resumida como o conjunto de sensações que nós, na fragilidade do nosso corpo e dentro de um efêmero tempo, conseguimos fluir no mundo que nos é dado. Porém, na dimensão da fé, encontramos outro sentido para a vida: viver é ser feliz servindo com alegria! Mesmo nas adversidades do tempo e nos contrários da história, encontra a felicidade quem serve com alegria, quem se torna dom de Deus para os mais necessitados. E quando o tempo se encerra e a morte se apresenta, revigoramos nossa confiança de que a vida daqueles que se fizeram servidores do bem não fica encerrada no túmulo, senão que é glorificada e eternizada em Deus. Nesse sentido, diante da partida repentina do Padre Jaime Inácio de Oliveira SAC, as palavras do Mestre são reconfortantes: "bem aventurados os pobres em espírito porque deles é o Reino do Céus" (Mt 5,3).
2. Sua história familiar
Jaime Inácio de Oliveira nasceu no dia 11 de outubro de 1953, na cidade de Pedra Azul (MG), eclesialmente pertencente à Diocese de Araçuaí. Os seus pais, Gerolino Inácio de Oliveira (In memoriam) e Maria Meireles Machado, tiveram dez filho sendo que o Jaime era o segundo Sua infância humilde, marcada pela simplicidade familiar, valor que Jaime cultivou de forma marcante ao longo de sua vida. Realizou os estudos básicos em sua terra natal, aonde também exerceu a profissão de comerciário.
3. Formação sacerdotal palotina
Numa estadia por breve período em Glória de Dourados (MS), conheceu os palotinos. E em 1977 ingressou no 3° ano do Ensino Médio no Seminário Rainha dos Apóstolos, em Vale Vêneto (RS). No ano de 1978, Jaime migrou para Santa Maria (RS) onde iniciou o Curso Integrado de Filosofia e Teologia, no Colégio Máximo Palotino, e também onde passou a ser conhecido por um apelido carinhoso que o acompanhou por toda a sua vida, "Tio". Em 1980, foi para Buenos Aires, Argentina, fazer o noviciado. Já no ano de 1981, retornou ao Colégio Máximo Palotino a fim de concluir o Curso Integrado de Filosofia e Teologia, o que aconteceu em 1983.
Concluída a formação ordinária, Jaime foi designado para o estágio pastoral em Anori (AM) nos anos de 1984 e 1985. No dia 25 de março de 1985, motivado pelo apostolado missionário e pela devoção Mariana, Jaime realizou sua consagração perpétua na Sociedade do Apostolado Católico (SAC). Após esse ato, dignou-se, no dia 2 de fevereiro de 1986, tornar-se presbítero pela imposição das mãos de Dom Gutemberg Regis Freire, em Pedra Azul (MG). Após a ordenação, Padre Jaime retornou a Anori para dar continuidade ao seu trabalho missionário.
4. Afastamento do exercício sacerdotal e o seu retorno
No entanto, nos contrastes da vida, em 1988, não conseguindo conciliar suas limitações pessoais com o exercício do ministério sacerdotal, Padre Jaime pediu afastamento do exercício de seu ministério.
Nesse período de afastamento não deixou de fazer o bem, de trabalhar para a comunidade e de cultivar suas virtudes pessoais: humildade, simplicidade e serviço. No deserto do afastamento, que durou aproximadamente 20 anos, Padre Jaime cultivou belas flores, que foram possíveis de serem admiradas quando ele retornou para a comunidade palotina. Isso prova que mesmo na falibilidade e na fraqueza humana, Deus consegue fazer emergir a sua graça. No ano de 2007, com aprovação do Conselho Provincial fez a experiência de reintegração na comunidade palotina através da Paróquia Rainha dos Apóstolos, em Manaus (AM).
No ano seguinte Jaime ingressou no Período Introdutório, em Cascavel (PR). o ano de noviciado foi um período muito exigente para o Jaime. Retornar à convivência comunitária nesses moldes depois de tanto tempo e ter que conviver com uma turma muito mais nova do que ele, era um desafio que o fazia temeroso. Contudo, para a surpresa de todos, principalmente de seus colegas de noviciado, o Jaime não tardou em ser quase como que o "Tio" de seus colegas. Sua disponibilidade e seu desejo de se integrar eram nítidos; sua dedicação por ser um bom noviço era encantadora; e seu carisma pessoal algo agregador. Ele realizava tudo o que era solicitado e acompanhava o desenvolvimento do noviciado com maestria. Na oração era um belo testemunho de devoção a Maria e a Vicente Pallotti, e na vida fraterna um solícito amigo.
5. Missão em Moçambique
Realizado o noviciado, Padre Jaime pôde fazer novamente sua consagração (temporária) na Sociedade do Apostolado Católico, o que aconteceu no dia 6 de janeiro de 2009, durante a Assembleia Provincial, no Seminário Rainha dos Apóstolos, em Vale Vêneto (RS). Logo em seguida, foi designado para trabalhar na Missão Rainha dos Apóstolos, em Moçambique. Padre Jaime identificou-se rapidamente com a vida na missão, seu jeito simples o aproximou significativamente do povo moçambicano. Padre Paulo Jair dos Santos SAC, na missa de corpo presente, disse que "o Tio era muito querido por todo o povo, tanto pelos católicos quanto pelos de outras religiões. Era muito querido pelos seminaristas e se dedicou incansavelmente pela construção do seminário. Na feira da cidade era muito conhecido principalmente por pedir descontos, era uma presença amiga e sempre servindo". Nesse contexto, Padre Paulo enfatizou a dedicação do Jaime na construção do seminário, testemunhou que ele muitas vezes se atrasava para o almoço porque fazia questão de acompanhar a obra. Vale ressaltar que durante seu tempo de afastamento, Jaime aprendeu carpintaria, trabalhar com encanamentos e sistema de eletricidade, o que foi muito útil na colaboração com a construção. Depois de um trabalho árduo, no dia 25 de janeiro de 2014, ele pode contemplar a obra que ajudou a construir na inauguração do Seminário São Vicente Pallotti.
6. Em 2014, no Brasil..
Embora o trabalho na missão estivesse bom, produtivo e evangelizador, Padre Jaime precisou retornar ao Brasil para fazer uma espécie de atualização da Teologia para que, com isso, pudesse voltar a exercer o ministério sacerdotal. Assim, em 28 de janeiro de 2014, passou a integrar novamente a comunidade do Colégio Máximo Palotino (CMP). Mesmo com saudades de Moçambique, o Tio se sentia bem na nova comunidade - eis mais um belo dom do Jaime: era obediente e se sentia bem e era dedicado em qualquer lugar para o qual fosse designado. Durante o retiro dos professos temporários em Vale Vêneto, em fevereiro, pôde se integrar com os novos colegas da Teologia. A integração não foi problema, rapidamente o Jaime "já era um com os demais". Ao final do retiro, ele já se sentia aceito e querido pela comunidade e deixava transparecer sua satisfação com o novo desafio. Além disso, neste período, sua consagração perpétua já estava marcada o que o fazia mais confiante e feliz por ter no coração certeza de que estava no caminho certo. Após o retiro, a comunidade do CMP foi para o acampamento na Praia Azul no litoral gaúcho. E nesses dias a vida surpreendeu a comunidade de uma forma difícil de entender.
O acampamento começou bem, num clima de fraternidade. Padre Jaime aparentava estar muito contente. Na quarta-feira do encontro, ele realizou a sua partilha de vida. Sua sinceridade e seu testemunho de vida emocionaram os colegas. Ele passou a ser visto com a admiração como alguém que, mesmo na distância, não perdeu seus bons valores e soube com humildade voltar para onde seu coração clamava. Na sua comunicação, ele deixou transparecer sua gratidão a Deus por tê-lo acompanhado mesmo no "deserto", sua gratidão à comunidade que o aceitou e a Maria e Pallotti a quem ele sempre atribuía a graça recebida de poder voltar. Seu último pensamento em sua partilha foi: "Eu preciso falar uma coisa, não para a minha glória pessoal, mas eu preciso falar. Quem tem Maria está protegido sempre. E ela fez muitas coisas boas na minha vida. Quem tem Maria está protegido, é só confiar".
7. Seus últimos dias e morte
Na quinta-feira, Jaime, que nunca reclamava de dores físicas, começou a manifestar que não estava bem desde. Ele já vinha apresentando alguns sinais de que estava com dores, mas não relatava nenhuma preocupação. Porém, nesse dia ele ficou acamado por causa das dores de cabeça e no abdômen. Após a missa da tarde, Padre Erno Aloísio Schlindwein, SAC foi ver como estava o Jaime e decidiram que no dia seguinte, logo cedo, iriam ao Hospital em Torres (RS). Após ser atendido e fazer alguns exames preliminares, o médico quis interná-lo porque ele estava com a imunidade muito baixa. Com o intuito de que ele recebesse melhor atendimento, Padre Erno levou o Jaime imediatamente para Santa Maria (RS), a fim de interná-lo no Hospital de Caridade. Voltaram de Torres para a Praia Azul somente para pegar as malas e avisar a comunidade que eles estavam voltando para Santa Maria. O Jaime estava aparentemente tranquilo, na hora de se despedir da comunidade ele disse "fiquem tranquilos, eu não vou morrer", sorriu e foi embora.
Durante a viagem, as dores ficaram mais fortes, mas ele não reclamava. Ao chegarem à cidade de Santa Maria, Pe. Erno levou-o direto para o Hospital de Caridade onde ele foi atendido. Internaram-no imediatamente na Unidade de Tratamento Intensivo (UTI) para tentar conter as dores. No entanto, todos os esforços foram inúteis e, na manhã do dia 22 de fevereiro, Padre Jaime faleceu, exatamente uma semana antes de realizar sua consagração perpétua, que já estava aprovada e marcada para o dia primeiro de março. A notícia surpreendeu a toda a comunidade Provincial, principalmente a Delegação em Moçambique e a comunidade do CMP. A rapidez do evento deu um tom de irrealidade ao fato. Ao retornarem ao CMP, na tarde do sábado, a comunidade encontrou o Tio já sendo velado.
8. Celebração e sepultamento
No domingo, dia 23, foi realizada a missa de corpo presente no CMP, presidida pelo Pe. Edgar Xavier Ertl SAC, reitor provincial, e concelebrada por vários padres. Marcaram presença várias pessoas, tanto membros da Província quanto comunidades religiosas de Santa Maria e amigos dos palotinos. Estiveram presentes alguns familiares do Pe. Jaime, dois irmãos e uma irmã, vindos de Limeira (SP).
Na homilia durante a missa, Pe Vanderlei Luiz Cargnin SAC fez a reflexão sobre as possíveis implicações da morte desse nosso irmão: "São tantas as perguntas que estamos nos fazendo sobre a morte do Padre Jaime. Não sabemos a causa de sua morte. Só temos hipóteses e opiniões. Diante deste fato que significado tem essa morte para nós? O que ela nos faz pensar? O que ela nos ensina? Ela nos ensina que a vida é frágil! Entre quando começou a dor até a sua morte foram menos de 24 horas. Percebemos como não temos domínio sobre a vida, e por isso a vida precisa ser cuidada. A morte do Jaime faz com que tenhamos que mudar de planos: os planos que tínhamos para e com ele, e os planos que ele tinha para si mesmo. Nós tínhamos planos para este final de semana, mas tivemos que mudar tudo. A morte do Padre Jaime nos faz buscar a Deus, de fato, precisamos de Deus para entender a morte. Necessitamos de Cristo ressuscitado para ser a nossa esperança nesse momento de dor" Padre Vanderlei seguiu sua reflexão: "Outra pergunta que nos colocamos é: olhando para a vida do Padre Jaime o que ela nos ensina? O que podemos apreender da vida dele? Primeiro, ele era uma pessoa humilde, simples e desprendida. Estive no quatro dele ontem e percebi que no seu armário havia só três camisas. Ele viveu a simplicidade. Segundo, ele era dotado de uma disponibilidade ‘exagerada’, no melhor sentido do termo. Ele tinha uma disponibilidade ‘exagerada’ em servir, ajudar e trabalhar. Terceiro, ele tinha muito amor e devoção a Maria como companheira e guia na sua vida. E por fim, Padre Jaime foi um verdadeiro missionário. Ele era amigo de todos em Moçambique, dos católicos, muçulmanos e outros. No seu trabalho missionário, ele se identificou e amou aquele povo. Que a vida do Padre Jaime nos ajude a sermos mais disponíveis, simples, e termos um amor missionário".
A missa de corpo presente foi marcada por uma profunda emoção. O conjunto da obra realizada por Deus na vida do Jaime, misturado com os testemunhos sobre ele e com a dinâmica do episódio de sua morte, às vésperas de sua consagração perpetua, proporcionaram um clima de profunda reflexão e emoção até mesmo para os que não o conheciam e estavam presentes. Após a homilia, os seminaristas moçambicanos do CMP juntamente com o Pe. Paulo Jair dos Santos circundaram o caixão e cantaram uma música em Txope, língua da localidade onde o Jaime trabalhou em Moçambique. Não teve quem não se comovesse com a beleza da melodia transformada pela emoção dos que cantavam. No final da missa, antes de fecharem o caixão, as palavras da irmã do Padre Jaime também foram comoventes. Ela disse: "Diante do que estou vendo aqui, diante da demonstração de tanto carinho e diante do que vocês falam sobre o meu irmão, não pode mais haver tristeza no nosso coração. Eu, em nome da família, agradeço por tudo o que vocês fizeram por ele, pela chance de ele recomeçar e por tudo que estamos vivenciando aqui".
Feita a última despedida, o cortejo seguiu para Vale Vêneto onde Pe. Jaime foi sepultado no cemitério dos Padres e Irmãos Palotinos. Agora ele estará para sempre próximo a seus confrades.
Por Pe. Clesio Facco, SAC