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22/08/2024 - In Memoriam

Padre Sebastião Lovato (1916-1972)

Nasceu no dia 04 de fevereiro de 1916, em Arroio Grande, distrito de Santa Maria. Seus pais, José Lovato e Maria Comassetto, vieram da Itália, ainda pequenos. Ele de Vicenza e ela de Treviso. Sebastião era o penúltimo entre dez irmãos. Na família reinava muita harmonia e sobretudo profundo cristianismo, apanágio, aliás, de todas as famílias da região italiana. A reza do terço e a missa dominical eram algo sagrado e seguido à risca. A família Lovato não era abastada e nem pobre, mas remediada. As lides agrícolas eram seu sustento. Quem batizou o menino foi o então pároco de Arroio Grande, o zeloso Pe. Domingos Nostro. Contou o Pe. Lovato que sentiu muito a morte dele, ocorrida a 05 de maio de 1925, e, em Roma, no mesmo dia, morria também o Pe. Roberto Kuklok, que tempos antes fora cura do lugar. O Sebastião, como todas as crianças daquela época, teve que aprender a doutrina em italiano. O catequista era seu tio, homem de muita fé e piedade. À sombra duma árvore, após o almoço, ministrava o catecismo e, nos últimos dias, deviam ir à igreja ouvir também as instruções do Pe. Valentim Zancan.

Quando voltavam da missa, quem soubesse algo sobre o sermão do padre ganhava uma viagem a Santa Maria, junto com o pai, quando ia vender os produtos da terra. Disse o Pe. Sebastião que ganhou vários desses prêmios. "E sabem - insinuava a mãe - que eu desejaria ter um filho padre?" Um dia, quando já tinha feito a Primeira Comunhão, a mãe perguntou aos gêmeos (o José e o Sebastião): "Quem de vocês desejaria ir para o Seminário?" O José foi logo dizendo que não iria, mas o outro levantou o dedo. Meses depois foi com outro companheiro apresentar-se ao Pe. José Busato. Este asseverou que o Sebastião não ficaria padre, mas sim o outro. A história provou o contrário.

Em 1932, já com 18 anos, Sebastião entrou no Seminário de Vale Vêneto. Não se ambientou logo devido ao minucioso horário, fileiras, silêncio, etc. Um dia vestiu a fatiota, pôs a gravata e foi ver a praça e admirar os montes. Sem demora aparece-lhe o Ir. Simão e começa o sermão... "e esta gravata? Fora com ela!..." "Por que? - respondeu o menino - Foi mamãe que m'a deu e custou oitocentos réis". Sem perder tempo, Ir. Simão lha arrancou. Pe. Sebastião declarou que desde aquele dia nunca mais usou gravata.

Em Vale Vêneto era reitor o bondoso e compreensivo Pe. Rafael Iop e professores: Pe. Jorge Zanchi, Ir. Simão Michelotti e Ademar Rocha e, mais tarde, Pe. Casimiro Tronco. Não faltavam os castigos da época: copiar a lição, rezar em pé, recitar certo número de jaculatórias, não participar do esporte ou lavar pratos, conforme o peso da falta, como aconteceu quando, na aula, Lovato retirou a cadeira do vizinho. Este caiu estrondosamente no chão, derramando a tinta e esparramando os livros. Ganhou três semanas de copa. Recebeu boa admoestação e diz ele que se cuidou mais para o futuro. Mas apesar disto não condenou o método da época. Em quase todas as famílias os castigos, às vezes, eram mais severos. Contudo, a vida no Seminário corria alegre e simples. As desistências não eram tantas como em outros tempos.

Pe. Lovato vestiu o hábito da S.A.C. em 1938. Em 1939 ficou no Patronato para acertar a dispensa do serviço militar e tirar a caderneta de 3ª categoria. Passou o ano esperando e o tal de documento não apareceu. Mais tarde teve que apresentar o certificado de batismo para ser eleitor.

Os primeiros dois anos de Filosofia, os fez em São Leopoldo e o terceiro em Polêsine, e toda a Teologia, novamente, em São Leopoldo. Em todo currículo do Seminário Menor e Maior, o Sebastião sempre foi o mais alegre e expansivo. Suas anedotas e estórias tinham o sabor da hilariedade e arrancavam gostosas gargalhadas. Era o mel que atraía e descarregava os rostos duros e tornava a vida do Seminário mais suave, apesar da rija disciplina e horários apertados. Uma anedota contada por ele sempre era exuberante de graças e mímicas. Só não ria quem fosse surdo e cego. Em São Leopoldo houve um ano de extrema rigidez, motivo pelo que o Lovato perdeu alguns de seus colegas, desde Vale Vêneto, que hoje podiam estar nas nossas fileiras. Mas, apesar disso, em 24 de novembro de 1946, em Arroio Grande, ordenaram-se junto com ele mais seis confrades. Foi a primeira ordenação a que eu assisti e que me calou profundamente e me deu ânimo para prosseguir a carreira. Os pais do novel padre choraram de alegria. Lembro-me que a mãe do mesmo de início não teve coragem de aproximar-se do filho padre. Este, porém, tanto fez até que os dois se abraçaram efusivamente, numa grande emoção. O novel levita, antes ainda de findar o ano de 1946, já entrava no pesado do ministério sacerdotal. Estreou em São Sepé, dois meses, e outro tanto esteve em Cadeado como Mestre de Noviços, em substituição ao Pe. Agostinho Michelotti. E, até 29 de julho de 1948, trabalhou em Cruz Alta, em cuja data foi nomeado Missionário Popular. Na Rainha da Serra, um dia, um comunistóide atacou- o na rua e asseverou-lhe:

"Um dia vou comer uma costela de padre." No dia seguinte, Pe. Lovato demandou à casa do cujo e disse-lhe de sopetão: "Aqui estou!" O atrevido não topou a parada. Como missionário pelo Rio Grande do Sul afora e em outros Estados, semeou em abundância a semente apostólica, embora não fosse do seu agrado - declarou em seu diário. Não deixou, porém, de ser um pastor novamente para Cruz Alta, como pároco. Nos dois anos seguintes desceu a serra e veio a ser pároco na Igreja das Dores. Aqui não poupou esforços para afervorar a comunidade, o Apostolado da Oração e teve o grande mérito da decoração que esta casa de Deus recebeu. Fez, outrossim, que os membros da "Fábrica" se entrosassem melhor na administração da paróquia. Foi mais dois anos missionário e depois, outros três, pároco das Dores. Em 1961 e 1962 esteve em Palotina. Ali grangeou muitos amigos, como sempre acontecia por onde ele passasse. Tinha um dom todo particular para esta arte. Em Palotina soube defender os colonos contra as injustiças relativas às terras, mal crônico do lugar. Coragem não lhe faltava.

E, finalmente, em 1964, voltou para a Paróquia das Dores, pela terceira vez. Parecia até que era seu destino trabalhar nesta comunidade. Pelo seu zelo, sempre a contento deste povo, grangeou profunda amizade e era muito querido de todos, porque era sacerdote como os fiéis queriam e o vivia na sua plenitude, seguindo à risca o que prometera no início de sua carreira: SER OUTRO CRISTO! Nunca banalizou sua dignidade sacerdotal.

"Será possível - repetia muitas vezes - para quem opta pelo sacerdócio não haver nenhuma renúncia? O ministro de Deus deve ser o sal da terra e a luz do mundo" (Mt. 5, 13-14). O Pe. Lovato queria ser sempre o sacerdote que salva, ser o sinal e a marca de Cristo. Visitar os irmãos para elevá-los e trazê- los à comunidade paroquial. Suas visitas às famílias faziam um bem imenso. De modo especial ele visitava os doentes e os pobres. Por isso era o AMIGO DOS POBRES E DOENTES.

Estes eram a pupila dos seus olhos. Era a alma das Damas de Caridade da Paróquia das Dores, fazendo um grande apostolado neste setor. Podia ser o mais miserável dos becos e ruelas: recebia o carinho e o conforto do apóstolo do bem. Onde estavam o ódio, a discórdia, as dúvidas, os desesperos, as tristezas, as trevas, sabia levar a paz, o perdão, a fé, a caridade, a esperança, a alegria e a luz. Não era proselitismo, era viver seu sacerdócio e o vivia com alegria. Onde ele ia esta virtude ia junto, pois eram irmãos inseparáveis; era a que lhe dava um sabor todo próprio e um colorido especial às suas conversações e estórias.

Promoveu várias romarias ao Santuário de Nossa Senhora do Caravaggio, com mais de centenas de romeiros cada vez. Uma foi por ocasião do seu jubileu sacerdotal junto com seus colegas de ordenação, imprimindo sempre um cunho de penitência e piedade. Quis celebrar as bodas de prata sacerdotais junto à comunidade das Dores. A ela tinha dado metade de seu sacerdócio. Era um dever de ambas as partes. Foi uma consagração a data jubilar.

Quando escolheu seu novo campo de trabalho, em Caçapava do Sul, ali começou a sentir-se mal do coração. Veio a Santa Maria a fim de buscar recursos. Quem tratou dele foi o Dr. Milton Sarturi. Ele desejava ficar bom e continuar seu ministério. Mas Deus quis chamá-lo para a eternidade. No dia 22 de agosto de manhã celebrou sua última missa. Entre os assistentes estava uma Irmã de Maria, a qual notou uma compenetração e tanta unção na celebração que a levaram a pensar consigo mesmo: "Não será esta a última missa do Pe. Lovato?" Realmente foi. As 4h da tarde entregou sua alma ao Criador. Um ataque cardíaco vitimou-o.

Seu corpo foi velado na Igreja das Dores. A missa concelebrada por mais de 40 confrades e irmãos no sacerdócio; o acompanhamento e o enterro foram uma apoteose. Tudo isto se deve à estima que a comunidade, à qual tanto deu de seu sacerdócio, lhe tinha. Quantos amigos sinceros deram-lhe o último adeus e choraram sua prematura morte.

Pe. Claudino Magro, SAC