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Padre José Cancian (1917-1977)

Achava-se ele em Palmitinho, trabalhando com muito entusiasmo e alegria e para contento de todos, quando, no dia 15 de dezembro de 1976, sofreu um acidente vascular (derrame cerebral ou trombose). Conduzido imediatamente ao Hospital de Caridade, em Santa Maria, onde há maiores e melhores recursos clínicos, aí veio a falecer, às 2h do dia 15 de fevereiro de 1977. Apesar de todos os cuidados médicos, não recuperou a consciência. Sofreu muito, durante 60 dias, sem possibilidades de comunicar-se com os médicos, acompanhantes e visitantes.
Só Deus sabe o que terá acontecido no fundo do seu coração naqueles dias de sofrimento e de angústia. Sua morte foi deveras uma Páscoa marcada pelo sofrimento e também pela alegria do encontro com o Senhor da Vida e da Morte. À medida que se aproximava o momento final, seu rosto, antes contraído pela dor, adquiriu a serenidade e a paz, que lhe eram peculiares.
Seu corpo foi velado, nas primeiras horas do dia, no necrotério do Hospital de Caridade. Às 8h houve missa concelebrada por bom número de sacerdotes e contou com a participação de muitas pessoas do hospital e das comunidades religiosas locais. Logo após a missa, seu corpo foi conduzido à Igreja de Vale Vêneto. As 17h houve missa de corpo presente, concelebrada por mais ou menos 40 sacerdotes, notando-se entre eles o representante do bispo diocesano e o pároco da Igreja de Nossa Senhora de Fátima, em Santa Maria. A igreja local foi incapaz de acolher a todos os amigos do Pe. José, que vieram de muitos lugares para acompanhá-lo até o seu sepulcro. No dia 16 de março completaria 60 anos de vida e exerceu o ministério sacerdotal por mais de 33 anos Sua vida foi relativamente breve, mas muito rica de trabalhos, como a seguir veremos.
No momento em que sentimos crescer em nossas filas o vazio deixado pela sua partida, é bom e é justo que guardemos a recordação e o espírito de quem nos amou e serviu desinteressadamente durante toda a sua vida. Pe. José Cancian nasceu no dia 16 de março de 1917, em Nova Palma. Seus pais foram Pedro Cancian e Cristina Redin. Dividiu a alegria da existência com mais quatro irmãs, sendo uma delas religiosa palotina. Aos seis anos de idade faleceu seu pai. Este acontecimento marcou profundamente a sua vida e a sua atividade. Amparado por sua virtuosa mãe ingressou no Seminário Rainha dos Apóstolos, em Vale Vêneto, no dia 07 de março de 1928.
Fez ali os seus estudos primários. De 1930 a 1934 completou os cursos ginasiais no Seminário São José, em Santa Maria. De 1938 a 1940 foi aluno do Seminário Central de São Leopoldo, onde fez os estudos de Filosofia. No mesmo seminário, de 1940 a 1944, estudou Teologia. No dia 05 de dezembro de 1943 recebeu a ordenação de presbítero em Júlio de Castilhos.
Terminados os seus estudos em 1944, Pe. José inicia logo a sua caminhada sacerdotal e religiosa. Seu primeiro campo de trabalho foi o Patronato Antônio Alves Ramos, em Santa Maria. Permanece aí por um ano como auxiliar do diretor. Em 1946 assume a responsabilidade pela Paróquia de Novo Treviso. Na primeira metade do ano de 1947 exerce a função de coadjutor de Vale Vêneto e, nesse mesmo ano, é nomeado pároco de Dona Francisca, onde fica até o fim de 1948. De 1949 a 1951 retorna a Vale Vêneto e trabalha como orientador espiritual e professor do Seminário Rainha dos Apóstolos. De 1952 a 1955 encontra-se em Augusto Pestana como mestre de noviços. Em 1956 assume a Paróquia de Silveira Martins. Em 1957 vamos encontrá-lo em Rio Grande, onde dirige o Abrigo de Menores. De Rio Grande retorna a Augusto Pestana. Ali permanece até 1966, exercendo por dois anos o cargo de coadjutor e, a seguir, as funções de pároco. De
1967 a 1972 Pe. José trabalhou como pároco de Vale Vêneto. Em 1973 trabalha como pároco e coadjutor em Terra Roxa, Paraná. No fim desse ano, por motivos de saúde, retorna a Vale Vêneto e aí fica até julho de 1974. Em agosto de 1974 assume a capelania do Hospital de Caridade, em Santa Maria, onde ficou até o início de fevereiro de 1976, dedicando-se inteiramente ao cuidado dos doentes e do pessoal do hospital. Em maio de 1976, com a saúde bastante combalida, vai a Augusto Pestana. Nos primeiros dias de dezembro de 1976 dispõe-se a substituir por três meses o pároco em viagem de estudos, em Palmitinho, RS. Com muita alegria e dedicação serve àquela comunidade cristã, que sente logo a sua bondade e doação. Após 15 dias de trabalho em Palmitinho, sofre o acidente que o levou à morte.
Difícil, para não dizer impossível, é definir uma pessoa, pois esta aparece sempre envolta nas dobras do mistério. A pessoa, mormente a de um padre, é indefinível. Podemos apenas entrever algumas facetas do seu mistério. Pe. José foi uma pessoa profundamente marcada pelo sofrimento físico e moral. Além de nunca ter gozado de boa saúde e ter sofrido dores atrozes, que ele suportava sem queixa alguma, era dotado de uma sensibilidade de consciência que beirava o escrúpulo. Sofreu muito diante das suas limitações físicas, psíquicas e morais. Amparado, porém, por uma sólida vida de piedade eucarística, por um constante espírito de oração e por uma filial devotação à Maria Santíssima e a São Vicente Pallotti, bem como a todos os santos e anjos do céu, logrou superar as dificuldades, inclusive vocacionais, e criar em si e irradiar nos outros um clima de esperança e de confiança.
Até o fim da vida ele se tinha proposto cultivar o otimismo e a confiança. Sua vida inteira esteve sob o signo do serviço desinteressado e da disponibilidade. Levado por um espírito de total confiança na comunidade nunca reservou algo para si, não teve bens e nem se apegou a postos e trabalhos. No final de cada ano punha-se sempre à disposição dos seus superiores. Vibrava com a comunidade, sofria com ela e jamais foi um individualista e um acomodado. Assumiu com espírito de fé, não sem relutância interna, postos para os quais se julgava incapaz, por exemplo, o cargo de Mestre de Noviços. Não queria fazer, porém, a sua vontade, mas a de Deus. Seu desprendimento pessoal, manifestado em todo o seu modo de ser e de agir, traduzia-se numa dedicação sem limites a todos quantos dele precisassem, sobretudo os pequenos, os doentes e os pobres. Serviu desinteressadamente a todos.
Deixou anotações espirituais valiosíssimas através das quais se percebe uma pessoa que sofre, que luta e que se empenha por servir sem esperar nada para si. Procurou sempre manter-se atualizado nos seus estudos, com o fim de melhor servir a todos. Foi um dos divulgadores e entusiastas da boa imprensa, sobretudo da nossa revista Rainha. Preocupou-se sempre para que os fiéis e os seus alunos tivessem boas leituras. Empenhou-se muito pelas vocações e pela união e fraternidade entre os confrades. A imagem do Bom Pastor ocupou um lugar muito grande nas suas anotações espirituais.
Como bom pastor ele lutou muito pela paz e pela unidade. A ideia da unidade foi marcante em sua vida. Basta para isto ler o que escreveu no dia de sua ordenação: "Meu Deus, que grande graça que recebi no dia de hoje! Fui ungido e ordenado sacerdote para sempre. Seja isto para a maior glória dos Corações Eucarísticos de Jesus e do Coração Imaculado da Rainha dos Apóstolos, aos quais consagro o meu sacerdócio. Mil graças, meu Deus. Infinitos agradecimentos por meio de Jesus vos dirijo. Fazei, ó Sagrados Corações, que eu miserável seja um instrumento nas vossas mãos para implantar nos corações de todos os sacerdotes o espírito de união, daquela união que Jesus pediu por seus apóstolos e por sua Igreja ao se despedir, depois da instituição da Eucaristia e do sacerdócio, na quinta-feira santa. Abrasai meu coração no fogo da caridade, do sacrifício, da união e santidade enfim".
Os que o conhecemos podemos testemunhar que ele sempre procurou ser um elo de união e um fermento de paz, onde quer que se encontrasse, no que se mostrou deveras um autêntico filho de Pallotti.
Pe. João Batista Quaini, SAC