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Padre Mateus Soldera (1921-1986)

Nasceu no dia 05 de junho de 1921, em Novo Treviso, num lar de onze irmãos, entre os quais os PP. Artur e Antônio. Ingressou no Seminário em 1937 e fez os cursos ginasiais em Vale Vêneto, exceto o terceiro ano, feito no Seminário São José, em Santa Maria. Fez o Noviciado em 1944, em Polêsine, e nessa mesma casa cursou Filosofia e Teologia, ordenando-se sacerdote também nesse local, no dia 24 de dezembro de 1950.
Iniciou seu ministério sacerdotal no Seminário de Faxinal do Soturno (1952) e no ano seguinte auxiliou o Pe. José Stefanello no início da construção do novo Seminário Maior, em Santa Maria. Nos anos de 1954 e 1955 fez parte de um grupo missionário. Já em 1956 foi ao Mato Grosso do Sul (Amambai). Em 1958 retorna para o Sul, em Cruz Alta e em Polêsine, até 1962. Esteve dois anos em Santo Augusto como coadjutor; de 1965 a 1969 esteve em Iporã e em Palotina. Foi vigário de Glória de Dourados, de 1971 a 1973. Adoecendo gravemente, foi obrigado a buscar recursos em Santa Maria. Após o seu restabelecimento integrou a equipe da área pastoral de Camobi, que compreendia também a Paróquia de Polêsine, onde o Pe. Mateus residia quase de forma permanente. Desfeito este trabalho em equipe, Pe. Mateus continuou seu trabalho nessa paróquia até o dia 12 de maio, quando faleceu. Sua morte ocorreu no Hospital Lazzarotto, em Porto Alegre, após infrutíferas tentativas de salvá-lo de uma trombose intestinal.
Não faz muito, Hemingway recebe o prêmio Nobel de literatura por um livro aliás bem pouco volumoso – O Velho e o Mar. Na superfície exígua dessa obra, Hemingway, qual outro Miguel Ângelo, retalha e insculpe um pobre pescador do Caribe, de pequena expressão social pelo que ele tem, mas de grande valor humano pelo que ele é como pessoa. Nessas páginas, a virilidade do velho (o homem comum) destaca-se e avulta até tocar as estrelas do céu pela invencibilidade na luta contra os perigos do mar infinito o contra as frustrações (não menores) da vida. Apesar da sua alma irredutível, o Velho se mantém simples como as crianças; o Menino o acompanha sempre e lhe fornece alimento, alegria e coragem. O Velho sofre porque nada tem com que recompensar o Menino, exceto ensiná-lo a dominar o mar e a triunfar sobre todas as frustrações do ser humano.
O Pe. Mateus Soldera era um homem desta fibra – combinação perfeita do espírito irredutível do Velho e da simplicidade alegre do Menino. Nasceu em Novo Treviso, município de Faxinal do Soturno aos 05/06/1921 para, logo depois, batizar-se de São Marcos da mesma localidade. É bem provável que, nessa ocasião, o leão de cimento e ferro que enfeita a escadaria da Igreja tenha levantado a pata direita numa saudação àquele que viveria daí por diante não só como padre, mas também como espaçonauta da amplidão sempre metido em aventuras inocentes, caçadas e pescarias. Era íntimo dos espaços abertos, das várzeas dos rios, das matas, dos banhados e das campinas.
Ingressando no Seminário de Augusto Pestana, no ano de 1936, o Mateus se fez notar entre seus jovens colegas por aquilo que ele de fato era; os meninos argutos não tardaram em descobrir-lhe a identidade pessoal. Esqueceram o Mateus; trocaram-lhe de nome; passou a ser conhecido por todos e para sempre como o “Campeão”. Mais tarde, ao ser ordenado sacerdote pelo saudoso Dom Antônio Reis, aos 24/12/1950, na Igreja de São João do Polêsine, passou a chamar-se definitivamente “Padre Campeão”. Viveu sempre corajosamente, mas simples e pobre. Nunca ambicionou dignidades eclesiásticas, viagens e mordomias ultramarinas ou destaques especiais. Quase sempre foi coadjutor de paróquias ou missionário popular. Trabalhou nos Estados do Rio Grande do Sul, Paraná e Mato Grosso, alegrando e edificando a todos, não só pela mensagem do Evangelho e por sua dedicação à Igreja, mas também pelo espírito indômito com que se identificava com as alegrias sadias do homem comum. Participava de pescarias, caçadas, contando causos, estórias e aventuras pitorescas.
No tempo de seminário, dedicou-se apaixonadamente ao trabalho, ao estudo da língua latina e da música. Como horticultor transformava áreas semidesertas em vergéis de grande produtividade. Como se fora um lírico da estatura de Ovídio gostava de passear entre os canteiros de ervilhas, couves e demais hortaliças falando e improvisando poesias latinas. Por isso, mereceu do saudoso Pe. Jorge Zanchi uma linda poesia latina dedicada (ad Campionem poetam – ao poeta Campeão). Devoto fervoroso da Virgem e do Mistério Eucarístico, tentou compor canções musicais para celebrá-los. Depois de padre, continuou a identificar-se plenamente com o homem comum. Por suas extravagâncias em caçadas e pescarias muito teve de sofrer. Sua espiritualidade se concentrava no rosário através do qual aprendeu não só a valorizar a vida de trabalho, de sofrimento e de luta do homem comum, mas também aguardar a esperança da ressurreição e da vida eterna. (Pe. Alderige Baggio, SAC)
“Padre Mateus pode ser caracterizado como um homem de grandes paixões, de grandes ânsias e buscas. Paixão pelas matas, campos, lagoas, rios, pela horta, pelas ervas medicinais, pela música. Foi igualmente apaixonado pelas dimensões espirituais, por Deus, Maria, pela palavra de Deus, pelo povo… Ainda se pode caracterizar o Pe. Mateus como uma pessoa marcada pelo sofrimento e pelos desafios da vida. Em sua vida encontramos essas coisas: Não aparentava o que era. Na simplicidade de seu falar, vestir, ele era um homem com sua rudez, seu jeito, seus defeitos, sua bondade.
Descobriu a alegria de servir. Servia com alegria e servia suas coisas pequenas. Ele era muito mais homem na cozinha que na sala. Nunca se envergonhou do trabalho manual e nas pescarias era ele quem tomava a dianteira. Quando alguém o cativava, era o amigo fiel e sabia ser amigo até o extremo. Pode-se dizer que, numa figura de homem simples e até rude, escondia-se uma grande alma. Não teve o privilégio da fineza social, do jeito agradável para todos, mas teve o privilégio da perseverança, da valentia na luta, da participação do Calvário de Cristo”.
Pe. Francisco L. Bianchin, SAC